Digam lá que não têm saudades do regresso às aulas. E aulas, refiro-me a aulas de qualquer um dos ciclos preparatórios para o ensino superior.
Ir comprar canetas que só apetece experimentar em tudo o que é papel, os cadernos a cheirar a novo, com as folhinhas ainda tão direitas e imaculadas, os estojos novos, onde têm de caber as mil canetas de cores diferentes que comprámos, das quais não usaremos nem cinco ao longo de todo o ano lectivo. As mochilas, que na minha altura não tinham rodinhas, levavam os livros das disciplinas de um dia inteiro, chegava a andar com 10 quilos de material escolar às costas.
Os dossiers onde eu colava recortes de revistas do que eu mais gostava, cantores, actores, desenhos animados, fotos minhas com os amigos, colava tudo o que tinha simbolismo e cheiro a adolescência. Os livros novos que só apetecia explorar, mas que sabíamos que mais dia menos dia nos dariam dores de cabeça. Os lápis novos, que afiávamos de raiz, porque eram vendidos sem ponta, que saudades!
Fazer os sumários no início da aula, para saber o que íamos dar, dizer "Presente" quando a professora chamava o nosso nome, sermos chamados ao quadro, para escrever em ardósia, com giz branco para o "normal" e giz de cores para sublinhar ou evidenciar a parte mais importante do exercício. Ficar com pó branco na ponta dos dedos e adorar quando eramos nós a estrear o pau de giz branco, que acabava sempre por se partir ao meio nas nossas mãos, ou aproveitar aqueles cotos minusculos que a professora deixava, em formato de triangulo, que ainda davam para escrever mais uma ou duas palavras ou números.
Na primária, as mesas da escola onde andei ainda tinham um tampo de abrir, que tinham no topo uma ranhura para colocar a caneta permanente e o buraco para pôr o tinteiro, recordações de regressos às aulas muito anteriores. Adorava picotar as folhas com as letras do alfabeto, em cima de uma esponja amarela, com um pico pequeno, com cabo de madeira, onde colávamos um pequeno papel com o nosso nome (e agora já nem existe este sistema, agora há tesouras de picotar), usar os compassos, os esquadros, as réguas, os transferidores, era tudo tão jovem, era tudo tão primordial e interessante. E as plasticinas? Deliciosas de brincar! O cheiro da cola UHU, que era a que os meus pais me compravam e que na altura nos fazia comichão no nariz quando tirávamos a tampa, mas que nos permitiam fazer colagens de tudo, nos trabalhos plásticos, até os nossos dedos. Lembro-me que ficava com cola nas mãos durante pelo menos um ou dois dias!
As linhas de miósotis que fazía no caderno para diferenciar as matérias, na primária, que recordo com tanto prazer, porque era geralmente nestas pequenas flores que tinham de caber apenas numa linha, que se estreavam as canetas de feltro. Geralmente era uma embalagem de 12 canetas, 25 só para alguns, da marca MOLIN, e recordo-me muito bem da sensação de retirar a tampa e sentir aquele cheiro característico. Essas canetas já não serão uma realidade para os nossos filhos, porque a fábrica fechou, no entanto cada vez que vejo dessas canetas lembro-me dos desenhos que escolhia fazer com cada uma delas. O sol, que era sempre a amarelo torrado, os rostos dos bonecos que desenhava, a cor de pele, as flores sempre com o verde mais escuro, porque o mais claro era para a relva. O castanho para os troncos das árvores. Perdemos grande parte do que eram as coisas realmente boas de se andar na escola.
E hoje, já nem nos lembramos e quando chega a esta altura e vemos as crianças nos corredores, a escolher o material escolar, enquanto nós estamos a ir buscar a caneta azul número 523, desejamos cá dentro estar a correr, corredor atrás de corredor, a escolher as canetas mais bonitas, os afias mais elaborados, os cadernos da nossa cor preferida, correr de volta para ao pé dos nossos pais e perguntar "Posso levar isto?" vezes sem conta. Levar 3 ou 4 nãos, e não ficar chateada com isso, voltar a ir escolher substitutos. São recordações tão doces. Eu pelo menos sinto isso muito, vocês não?